Memória do Centro de umbanda Abaçá de Yemanjá no Gramacho
Investigação histórica. Fotos inéditas do Centro Abaçá de Yemanjá. Cerimonial de umbanda de centro da Avenida Darcy Vargas. Quando? Onde? Quem? História do Gramacho e Arredores.

A dedicatória da foto, em preto e branco, é assinada pela “madrinha” Maria Amélia G. Ferreira que informa tratar-se de uma lembrança de sua segunda obrigação no Abaçá de Iemanjá. A afilhada é a saudosa Marlene Maranhão, a Madi, mãe do Flávio Catraca, morador da rua Cantagalo, Vila Leopoldina III, em Gramacho.
O local, ele informa, é o centro de umbanda Abaçá de Yemanjá que se situava na Avenida Darcy Vargas, próximo ao Largo do Barreto, dirigido pela mãe-de-santo Dona Maria Domingues (em pé, ao centro, na primeira foto), esposa do Silvio Domingues, empresário da loja de artigos religiosos Flora Vovó Luísa, que ficava ao lado da padaria Aveirense, do português Silva, na antiga pracinha. A data é 27.04.69.
História
Cultos de matriz africana – notadamente a Umbanda – tiveram grande difusão no início dos loteamentos em Gramacho e Arredores, aproveitando a ausência ou precário atendimento católico (somente no final da década de 50 passou a ter missa mensal na pequena capela Sagrado Coração de Jesus, na rua Boa Sorte, e só em 1963 seria erguida a capela São Sebastião, perto da estação ferroviária) e a incipiente presença de denominações evangélicas.
A Umbanda foi um fenômeno no Brasil inteiro, ao ponto do escritor Edson Carneiro afirmar, na primeira metade do século XX, que ela em poucas décadas seria a religião predominante no Brasil, o que não se concretizou por variados fatores os quais não há espaço para aqui aprofundar. Grande parte de seu êxito se devia ao sincretismo de forte apelo popular que fundia crenças indígenas, cristãs (santos católicos) e credos de origem afro. Assim, atingia pessoas de diferentes credos, escolaridades e origens sociais.
No Gramacho, não foi diferente. A expansão da Umbanda foi grande, ao ponto de em muitas ruas haver um centro. Lembro os da Dona Rosa (rua Cantagalo), das Donas Dejanira & Zélia (rua Boa Sorte) e o da Dona Maria (Avenida Darcy Vargas), o da Tânia na rua Bom Jardim e em outras ruas.
Ao longo dos anos, a partir da década de 70, com a consolidação da presença da Igreja Católica e de denominações evangélicas (inicialmente Assembleia de Deus, Batista e Metodista) e com a conversão cristã de muitas de sua lideranças, os centros foram encerrando suas atividades. Atualmente, são poucos.
Da Umbanda para o Candomblé
O Centro de umbanda Abaçá de Yemanjá, da mãe-de-santo Maria Domingues – vê-se na foto a imagem de Jesus Cristo, sincretismo que não existe no candomblé – fez história no bairro. Sua sede na Avenida Darcy Vargas era muito frequentada. A difusão era tão grande que a loja “Flora Vovó Luiza”, de propriedade do casal Domingues, com a estátua do “preto velho” na entrada, situada na antiga pracinha, foi um ícone no bairro.
Essa foto, de 1969, tem grande importância histórica porque é uma das últimas como templo de Umbanda. Isto porque, pouco depois, a mãe-de-santo Dona Maria Domingues tornou-se iniciada do pai-de-santo candomblecista Joãozinho da Gomeia (1914-1971), nacionalmente famoso.
E o centro faria a transição do sincretismo da Umbanda (com suas imagens de santos católicos, caciques indígenas, caboclos e pretos velhos) para uma linha exclusivamente de matriz afro, a do Candomblé.
Família
A filha Fátima Domingues calcula que o Abaçá tenha encerrado suas atividades no final da década de 80. Com o fechamento do centro, Silvio abriu, no local, um bem sucedido comércio de “Ferro Velho”.
A família Domingues constituída pelos saudosos Sílvio e sua esposa Maria e pelos filhos Fátima, Rita e André, faz parte da história do Gramacho e Arredores. Silvio fez sua passagem em 1997 e Dona Maria em 2003. O imóvel foi vendido no ano 2000.
Eles se mudaram no bairro no final da década de 90, mas, passados tantos anos, continuam presentes na memória afetiva dos que os conheceram.
Gratidão
Agradecemos ao militar reformado, o amigo Flávio Catraca, a disponibilização das fotos inéditas do cerimonial religioso de sua mãe no citado centro, o que preserva a história do bairro, marcado desde o início pela diversidade e tolerância religiosa.
Créditos:
Pesquisa e texto: jornalista Roberto Aires;
Fotos: Acervo Flávio Catraca, 27.04.69;
Gratidão: Fátima Domingues, filha;
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