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Sabadão à noite, grana curta, recuperação de uma gripe, solteiro sem nada em vista pra hoje, final de mês, noite amena de inverno, o pensamento foi: “vou no mercado (chegando dez minutos antes de fechar às 21h), compro um milho de pipoca, algum docinho pra cota de pecado da noite, passo no Bar do Manel, tomo duas latinhas sem álcool e volto pra casa pra ver uns filmes e…”.
Paro no Manel e conheço o Jorge Prudente, veja você. Tá numa mesa ao lado, conversando com minha amiga Rose, e papo vai, papo vem ela comenta como há menos de dez anos essa esquina do bar do Zé Luís, num sábado como esse, estaria pegando fogo, cheio, festivo, assim como todo o entorno – e hoje é esse abandono. Tudo fechado, triste. Comento o que é indefensável: o centro de Caxias está morto, acabado. Pronto, laço estabelecido e conversa entabulada.
Em algum momento o papo cita Hélio Cabral e o Jorge puxa um samba do mestre e acompanho na íntegra. Meio surpreso o cara saca do telefone uma matéria sobre Seu Hélio pra me mostrar e mando na lata: eu que escrevi a matéria. Mais surpresa e descubro que ele é fã e leitor da Lurdinha. Revelo que acabei de fazer um filme sobre essa história e devo lançar nos próximos meses ainda.
Que grata alegria num sábado perdido…
A Lurdinha é um site que mantenho com recursos próprios há quinze anos e é por onde muito do que se tem na internet sobre a história do samba em Caxias está. Hélio Cabral e a lendária Escola de Samba Cartolinhas de Caxias, por exemplo.
Nessa altura, a conversa já flui como de amigos de muitos anos. Em pouco espaço de tempo vamos de Cartolinhas, União do Centenário, Capricho, Walter Alfaiate, Jorge Macarrão, Candeia, Paulinho da Viola, Salgueiro, os irmãos Neném e Gilsinho, Rolo Compressor, grupo Nosso Canto, o mestre Messias Neiva, Jamaica, Marco Bomfim, Ribeiro, a primeira Grande Rio, ufa…
Diz que tem setenta e que quando criança frequentava o Capricho do Centenário, lá na Floresta; e contou histórias de Seu Tião, presidente da escola e pai do conhecido ator Romeu Evaristo. O Capricho do Centenário, olha só, foi uma escola de samba fundada em Caxias em 1934… Isso mesmo: 1934.
Salgueirense convicto, Jorge ainda revela uma ligação forte com a Unidos de Lucas, o Galo de Ouro da Leopoldina, como lembrei a ele esse epíteto que acho maravilhoso.
Em mais de um momento o cara mareja os olhos, sinal de uma alma emocionada e sincera. Já me ganha, eu que choro fácil com as histórias do povo – as contadas nas ruas e não nos livros oficiais.
Volto pra casa feliz. Além de ter feito um amigo novo, venho com a constatação de que vale a pena escrever, pesquisar, documentar essas paradas. Muitas vezes, em momentos de baixa, a gente se pergunta se alguém de fato lê o que a gente escreve e situações como essa dão um afago maneiro na alma.
Aproveito pra informar a quem possa se interessar: vem aí A Semente do Samba de Hélio Cabral, lançamento nesse segundo semestre. Um pedaço de uma história caudalosa e sensacional que tentei durante anos financiamento pra um longa-metragem sem sucesso, mas que agora vem em versão curta, realizado com muito amor, carinho e com fotografia e áudio no jeito. E feito com um equipe simplesmente maravilhosa. Quem sabe ainda nessa encadernação, essa história vire um livro. Veremos.

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[ #croniquinhas, heraldohb, 2025 ]


heraldo hb

heraldo hb

. Animador cultural, escritor e produtor audiovisual nascido no século XX. .

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1 thought on “Histórias e amizades quando você menos espera

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