Nova unidade de conservação em Caxias. Legal! Mas e as outras?

Aconteceu nos dias 02 e 03 de abril, no campus da UFRJ Professor Geraldo Cidade, em Santa Cruz da Serra, o “1º Fórum Lazer e Turismo na Natureza em Xerém: Desafios e Oportunidades”. Uma iniciativa do Observatório de Turismo e Lazer Baixada Verde, em parceria com a Prefeitura de Duque de Caxias, Reserva Biológica do Tinguá (ICMBIO), Cedae e Serra Verde 98,7 FM.
Participei das discussões do segundo dia, 03/04, onde foi apresentado o projeto de criação de uma nova unidade de conservação denominada “Parque Natural Municipal Águas de Xerém”, na localidade conhecida como Fazenda Mineira, nas margens da Rebio Tinguá. O projeto prevê desapropriações e implementação de projetos urbanísticos, para favorecer à população, carente de espaços gratuitos de lazer, sobretudo nos dias mais quentes, uma alternativa à Cachoeira da Mata, que segundo relatos recebeu em um único dia mais de duas mil pessoas durante a onda de calor do verão deste ano.
Cabe destacar que a Cachoeira da Mata fica dentro da Rebio Tinguá, que na letra fria da lei só poderia receber visitação mediante autorização. Desde sua criação, em 1989, sempre houve debates a respeito da categorização, com propostas para mudar de Rebio para Parque, que facilitaria o acesso da população, o que nunca aconteceu por causa da resistência de entidades da sociedade civil organizada que desejam exatamente uma unidade mais restritiva com vistas à preservação. A preocupação é não só com o impacto que um grande número de visitantes poderia trazer à fauna e flora, como também a especulação imobiliária da parceria público-privada no território. O ex- prefeito de Duque de Caxias, Washington Reis, por exemplo, foi condenado na justiça por crime ambiental, ao realizar um loteamento dentro da Rebio.
A última discussão a respeito da Rebio Tinguá aconteceu exatamente dias antes do Fórum, exatamente no mesmo local (UFRJ Santa Cruz da Serra), no dia 29 de março. Foi uma audiência pública promovida pelo mandato do Deputado Federal Glauber Braga, do PSOL, onde estiveram presentes na mesa o ICMBIO e a Secretaria de Meio Ambiente de Nova Iguaçu, mas nenhuma representação da Prefeitura de Duque de Caxias compareceu, apesar de também ter sido convidada. Nessa audiência as entidades da sociedade civil presentes referendaram de forma unânime a permanência da categorização “Rebio”.
Apesar de não ser esse o tema do fórum, mencionei o debate ocorrido na audiência pública ao pedir a palavra, lamentando também a ausência de representação do governo municipal. E prossegui mencionando a situação das unidades de conservação já existentes. Como a nova unidade prevê desapropriações, lembrei do Parque Natural Municipal da Taquara, criado em 1992, que possui sitiantes até hoje, nunca indenizados. Nos últimos anos o Parque sofreu com o total abandono da gestão pública, o que pode ser notado pelo visitante logo ao adentrar, dado o estado das placas, quiosques e banheiro. Com a estiagem das chuvas desse ano, até a balneabilidade está ameaçada.
Com relação à APA São Bento, unidade de conservação municipal mais antiga e mais devastada, o governo no ano passado chegou a anunciar a criação do “Central Park” (https://lurdinha.org/site/construcao-de-parque-ecologico-na-gestao-da-familia-reis-parece-ate- mentira-entao/) nas terras da antiga Feuduc. Mas a única coisa que aconteceu até o dia de hoje foi a derrubada das árvores, o que soa irônico. A obra foi paralisada e o grande terreno, agora limpo e sem árvores, pode sofrer com invasões ou novos loteamentos irregulares.
Já a Rebio Equitativa, desde sua criação, em 2009, tem seu perímetro diminuído na Câmara de Vereadores para favorecer a forte especulação imobiliária (venda de lotes), incluindo também abertura de ruas onde antes era mata fechada. Também foi retirada de seu território uma área denominada “Monte do Azeite”, onde grupos religiosos utilizam o espaço para fazer suas orações, geralmente a noite. Com isso, alguns clarões já foram abertos na área de mata com fins de acampamento e fogueiras, afetando também a rica fauna local. E por fim, no ano passado deu-se início a um imenso loteamento em uma propriedade particular vizinha à Rebio, conhecida como
Fazenda do Surdo. A devastação é sem precedentes, com a retirada não só da vegetação como também de um morro inteiro.
Então, mesmo que o projeto “Parque Natural Municipal Águas de Xerém” seja ótimo e bem- intencionado, como confiar na sua viabilidade diante de tantas atrocidades ambientais que ocorrem em Duque de Caxias? Como garantir as obras necessárias e material humano para trabalhar e manter a unidade, se as já existentes sofrem com o abandono e com a constante ameaça de desaparecerem? Infelizmente as representantes do governo na mesa não puderam me trazer essas respostas. Possivelmente nem elas as teriam. Só resta a esperança de que, uma vez concretizado o projeto de uma nova unidade de conservação, o governo também volte seu olhar para a realidade das demais.
Para quem quiser conhecer mais sobre as unidades de conservação de Duque de Caxias, visite a exposição virtual “Caxias verde: olhares de encantamento”, do Museu Vivo do São Bento, disponível em https://www.caxiasverde.mvsb.com.br/. Pode ser que apareça uma mensagem de conexão não segura, mas basta ignorar e prosseguir ;).



